terça-feira, 5 de janeiro de 2010

A justiça está perseguindo as Igrejas Evangélicas brasileiras?

A recente decisão que condenou o casal Estevam e Sônia Hernandes por evasão de divisas, dada na terça-feira (1º/12) pela 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, põe novamente em destaque o nível de atenção dedicada pelo Ministério Público e pela Justiça aos movimentos religiosos de massa chamados neopentecostais evangélicos. Em crescimento contínuo há mais de 40 anos e com previsão de abranger metade dos brasileiros até 2020, as igrejas não têm atraído apenas fiéis. Sob os holofotes, ao reunir milhões de adeptos nas ruas, eleger parlamentares e colocar no ar programas diários e até canais exclusivos de televisão, despertam também a atenção de quem duvida de que o seu sucesso venha mesmo do céu. Os alvos preferidos têm sido as igrejas Renascer em Cristo e Universal do Reino de Deus. As principais denúncias, no entanto, enfrentam dificuldades na Justiça. O Ministério Público tenta encaixar a tese de que, como não precisam explicar a origem do que recebem, as igrejas mais engajadas em atividades extracultos podem estar lavando dinheiro. Assim, as empresas e fundações criadas para administrar canais de televisão, projetos assistenciais, bens imóveis e até contratar funcionários estariam esquentando dinheiro sujo. O problema é justamente esse: até agora, nenhuma prova trazida a público levou a indícios de dinheiro ganho em crimes. As acusações menos voláteis se baseiam apenas no fato de entidades com imunidade tributária investirem em negócios empresariais — o que a lei não proíbe, desde que os tributos das empresas sejam pagos normalmente. Ou seja, a possibilidade de haver lavagem já é motivo para acusações. “Aí é elocubrar”, diz Luiz Flávio Borges D’Urso, advogado que defende os Hernandes e preside a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil. Até o acidente ocorrido em janeiro com o prédio da sede da Igreja Renascer, liderada pelo casal, virou assunto para o MP. Uma investigação apura se o desabamento do teto do templo, na Zona Central de São Paulo, que matou nove pessoas, foi culpa da direção, mesmo tendo a recente reforma do telhado sido aprovada pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas da Universidade de São Paulo. Nesta quinta-feira (3/12), a Justiça concedeu liminar ao MP que suspende a execução da reconstrução do prédio. O MP alega que o edifício vai trazer impacto no trânsito da região, no bairro do Cambuci, e que uma comissão especializada da Prefeitura é que deveria ter autorizado o alvará. Segundo a Assessoria de Imprensa da Igreja, o alvará foi expedido em agosto e passou duas vezes pela avaliação da Comissão de Edificações e Uso do Solo (Ceuso). A Igreja, no entanto, funciona neste local, na zona central da cidade, há mais de 20 anos. Nem o jogador Kaká escapou. Membro mais ilustre — e responsável por um dos maiores dízimos — da igreja do apóstolo Estevam Hernandes, o craque de futebol recebeu na Itália, quando ainda jogava no Milan, uma intimação para prestar depoimentos sobre seu envolvimento na suposta lavagem. Não compareceu. A autoria da estranha intimação, no entanto, não foi assumida por ninguém. A defesa dos Hernandes desconfiou do pedido e descobriu que o documento não havia sido homologado pela Justiça brasileira, como manda a lei, mas saiu direto do MP. Marcelo Mendroni, promotor paulista que tinha o nome assinado no pedido, negou o envio. Para complicar, o documento ainda exibia as armas da Justiça, como se tivesse saído da 1ª Vara Criminal de São Paulo. “Por parte do Juízo, em momento algum se determinou ou se expediu ofício à Justiça italiana para intimação da mencionada testemunha”, disse o juiz da 1ª Vara em despacho. Para D’Urso, atribuir ao recebimento de dízimos a pecha de esquema de lavagem de dinheiro é criminalizar a atividade religiosa. “Todas as religiões sobrevivem das doações, que são destinadas à manutenção das entidades e a obras sociais comuns”, diz. A proibição de uma atividade lícita ou a criação de mecanismos que a restrinjam, para o advogado, é “uma hipocrisia”.
Condenação precipitada:
Em relação à condenação dos Hernandes por evasão de divisas, o advogado afirma que o juiz Fausto De Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, se precipitou, o que pode garantir a absolvição no julgamento da apelação. Segundo D’Urso, a sentença do juiz se baseou em provas vindas da Procuradoria de Miami, nos Estados Unidos, onde o casal cumpriu pena por entrar com US$ 56 mil não declarados. “Mas os documentos vieram para instruir o processo que corre na 1ª Vara, e não poderiam ser emprestados à 6ª Vara, salvo com autorização expressa da Procuradoria de Miami”. Segundo o advogado, a autorização é exigência prevista no Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal firmado entre os governos brasileiro e norteamericano, validado no Brasil pelo Decreto 3.810/01. Ele afirma que um ofício do Ministério da Justiça confirma a autorização verbal — e não expressa — da Procuradoria norteamericana, o que anularia as provas usadas na condenação. Como a fase de instrução acabou e o juiz não pode mais se manifestar no processo, só restaria a absolvição. “Juiz não pode emendar sentença, acabou sua jurisdição”, diz D’Urso.
CONTINUAÇÃO G/NOTICAS

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