“Há alguns meses acordei disposto a fazer uma loucura por Jesus. Já havia pensado nessa idéia, há aproximadamente dois anos, mas ainda não tinha tido coragem suficiente para colocá-la em prática e, também precisaria de mais uma pessoa para me auxiliar. Foi então que ouvi falar sobre fazer coisas para Jesus na mesma intensidade que Ele fez por mim. Essa palavra foi o impulso que precisava. Resolvi fazer o que planejava para Jesus: vestir-me de andarilho por um dia.
O objetivo era percorrer as ruas de Belo Horizonte como mendigo para viver como eles, sentir as mesmas dores, passar pelas mesmas dificuldades e entender um pouco da realidade que eles sofrem todos os dias, mas acima de tudo como jovem cristão. Convidei um amigo, chamado Lucas Rosa para essa missão. Ele aceitou o convite e decidimos criar algumas regras: oraríamos em cada ponto da cidade que parássemos, não levaríamos nenhum centavo e não pediríamos nada a ninguém. Deus nos daria o sustento.
Estava tudo preparado: cabelos sujos, barba mal feita, bermuda rasgada, chinelos nos pés, um boné e uma mochila. Partimos em direção ao centro da cidade. Durante o percurso, seguimos em espírito de oração. Ao iniciar meu diálogo, pedi a Ele que nos ajudasse a conseguir dinheiro para que, de alguma forma pudéssemos garantir o alimento. Em meu coração veio a seguinte resposta: “Não vou deixar vocês pedirem nada. Confie em mim, sou o Pai de vocês, cuido dos meus filhos”. Fiquei meio assustado, compartilhei com Lucas um pouco mais tarde, mas partimos rumo ao desconhecido.
Paramos em frente a um bar e pedimos água. Aproveitamos a oportunidade para falar do amor de Deus. Deixamos ali um pouco de paz em palavras. Prosseguimos o nosso percurso e chegamos ao complexo da Lagoinha, bem próximo à rodoviária de Belo Horizonte. Ao caminharmos fomos conhecer como era a Igreja da Lagoinha. Ali encontramos um rapaz. Começamos a conversar, quando ele estava prestes a nos evangelizar, compartilhamos o nosso propósito. Ele ficou admirado com nossa atitude e ao final perguntamos se poderíamos orar por ele. Oramos e imaginei que a cena foi um tanto inusitada para as pessoas que viam um mendigo orando por uma pessoa evangélica (risos).
Provisão
Ao terminar a oração, ele nos perguntou o que comeríamos. Respondemos que ainda não sabíamos. Ele então retirou a única nota que havia na carteira e nos deu. Eram vinte reais. Confesso que na hora gostaríamos de rir de tanta alegria e emoção. Procuramos um restaurante por perto e quando fomos colocar a comida uma dona nos observou com um olhar assustador. Talvez pensasse: “Será que eles vão sair correndo sem pagar a conta?” Bom, a verdade é que comemos muito e com direito a repetição. Quando acabamos de comer, pagamos nosso delicioso almoço, agradecemos e abençoamos a dona do restaurante e partimos para nossa jornada.
Lucas vestido de andarilho
Chegamos a uma praça, abrimos a Bíblia e logo começamos a pensar em como Deus era bom e maravilhoso por nos ter prestigiado com a refeição. Senti que o Senhor imediatamente disse ao meu coração: “Por que vocês estão tão felizes com uma simples refeição? Eu não disse que supriria suas necessidades? Não se alegrem com essas pequenas coisas, mas com meu filho Jesus que desceu do céu e morreu por vocês”. Tivemos tantas pequenas experiências que são inesquecíveis, porém não consigo relatar todas.
Testemunhos
Passado um tempo, fomos à rodoviária. Ali tivemos uma experiência com um rapaz que havia fugido de um Centro de Recuperação. Ele estava andando pela praça quando caiu em estado de convulsão, fomos ajudá-lo. Pedimos que um soldado do CBM-MG, que passava por ali, nos ajudasse no resgate. O rapaz melhorou e logo conversamos com ele. Depois o abraçamos e abençoamos a vida dele.
A tarde já caía e novamente estávamos com fome. Avistamos um carro que entregava marmitex para os moradores de rua. Chegamos ao automóvel, pegamos uma para cada e uma banana como sobremesa. Eu amo banana. Não se passaram cinco minutos de caminhada e Lucas viu ao longe um casal de usuários de drogas embaixo do viaduto. Então seguiu em direção aos dois andarilhos. Chamei-o de volta, porque estava com medo de perder a marmita, mas antes que ele pudesse atender ao meu chamado, já estava perguntando aos dois usuários se eles estavam com fome. Então Lucas deu sua marmita e a banana, fiquei sem escolha e tive que dar a marmita também. Relutei pela banana, mas ao final a entreguei também.
O sol já estava se pondo para dar lugar à noite. Aproximamos de uma igreja e ali um rapaz começou a conversar conosco. Contamos o que estávamos fazendo na rua e depois de ouvir toda a nossa história nos pediu para relatar nosso testemunho na célula naquela mesma noite. Compartilhamos a palavra, a experiência e ficamos para conversar mais um pouco. Depois que terminamos nossa participação, tínhamos que procurar um lugar para dormir.
Lucas em oração por rapaz após momento de convulsão
Não fazíamos ideia de como seria adormecer na rua. Sentamos um pouco debaixo de uma marquise, conversamos e refletimos sobre o que Deus havia feito. Ainda pensava na marmita que não havíamos guardado e em meios aos meus devaneios, surgiu uma Kombi ao nosso lado. Uma mão foi colocada para fora junto com um saquinho de papel. Levantei correndo pensando em ser alguma comida, e de fato era. Um baita de um pastel. Agradecemos ao Senhor e dividimos um com o outro. Estávamos satisfeitos e como Deus havia dito, cumprira mais uma vez Sua Palavra.
Hora de dormir. Começamos a andar já muito exaustos. Era meia noite. Não era nada fácil dormir em meio a agitação das ruas com garotas de programa nas esquinas, bares com seus últimos clientes, usuários de drogas perambulando pela noite. Encontramos um lugar na porta de uma loja e resolvemos nos deitar. Não conseguia dormir. Com um sono muito leve, sempre que passava um veículo, abria o olho muito assustado.
Ao amanhecer, refletimos em muitas coisas que aconteceram conosco. Vivemos mais algumas experiências e depois retornamos para casa. Vivemos uma fé prática, conseguimos sentir um pouco de como é estar nesse tipo de situação. Às vezes é necessário sair do conformismo e da caixinha quadrada que criamos para nossas crenças. Tanto Lucas, quanto eu saímos dessa experiência mais focados naquilo que Deus quer para nossas vidas.”
Neemias Rayner
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